Storytelling, business e dois canos fumegantes
Por Jorge Rocha
Um palhaço de peruca púrpura encaracolada e nariz vermelho faz truques de mágica e brinca com crianças vindas da Síria e refugiadas na ilha de Lesbos, na Grécia. Ele conta histórias divertidas, do tipo que envolvem o imaginário infantil e estimulam resposta e participação. As crianças, obviamente assustadas com toda a situação enfrentada para chegar até a ilha, aos poucos se deixam levar pelas histórias do palhaço e não demora muito para que peçam mais brincadeiras. Há envolvimento. Há engajamento. É um momento em que contar histórias pode mudar a realidade.
O que pode haver em comum entre a ação social desse palhaço em missão humanitária e um projeto de comunicação de uma empresa?
Vamos entender a história. Essa experiência foi contada diretamente pelo volunteer clown para Beck Slack, autora de Effective Media Relations for Charities: what journalists want and how to deliver it. As narrativas – tanto aquelas que o palhaço contou para as crianças quanto as que ele relatou para Beck – reforçam um conceito que a autora defende há tempos: “contar histórias é uma peça chave para a eficácia da comunicação”. Se nosso objetivo, como profissionais de Comunicação Digital, é buscar engajamento da nossa audiência – esse Shangri-la de todas as possibilidades -, então precisamos reconhecer de verdade e não como “obra de ficção” que storytelling é um meio sem escalas de chegar até lá.
Há reforços de todos os lados para atestar isso: até mesmo a neurociência comprovou que aprendemos mais e nos comunicamos melhor com a utilização de histórias. Como Beck nos lembra, a partir do caso aqui relatado, histórias com fortes toques pessoais voltadas para audiências específicas e bem estudadas auxiliam a conectá-las com a ideia publicizada. E isso – também – é business.
A mesma conceituação é defendida por Jessica Ann, CEO e Creative Director da Jessica Ann Media, que publicou o excelente Humanize Your Brand: how to create content that connects with your customers. Ela sugere uma equação muito simples que pode ser aplicada à estratégias de storytelling para business: conteúdo + contexto = engajamento. Por favor, esqueçam aquela história batida de “Content is king” que continua sendo usada por marketing messiahs como se fosse a cura de todos os males – e olha que quem está escrevendo isso é um conteudista! Você pode ter o melhor conteúdo disponível para o momento, mas se não compreender a audiência com a qual está lidando, a ambientação necessária para divulgação e propagação de sua mensagem, além da melhor forma de abordagem e envolvimento, então sua missão como storyteller – sua jornada do herói, se preferir – está ainda na fase inicial.
Uma estratégia bem definida de storytelling pode, a partir da construção de personas, ajudar a entender desejos, necessidades e vontades do público-alvo – ação que é o cerne do primeiro, quinto, sexto e sétimo dos 8 Ps do Marketing Digital. E afinal, as buyers personas, os clientes ideais, são essenciais para a condução de projetos de Inbound Marketing.
Storytelling também pode ser uma ferramenta poderosa no momento de planejar e executar uma ação comunicacional que vise uma forma de apresentar informações em grande quantidade em um modelo mais simples e palatável. No ano passado, a First Round, uma empresa de venture capital para startups, colocou no ar um projeto de visual storytelling chamado State of Startups 2015. O projeto consiste em simplificar visualmente os números que mostram o desenvolvimento, atuação e “saúde” das startups de tecnologia que apoia; números que contam uma história talvez complexa demais para ser bem entendida rapidamente em sua forma original. O resultado: insights sobre o que significa criar e gerenciar startups hoje ilustrados em vários tipos de gráficos e tabelas.
E agora eu respondo a pergunta feita lá no segundo parágrafo: o que pode haver em comum entre a ação social desse palhaço em missão humanitária e um projeto de comunicação de uma empresa? Evitar que haja sobrecarga cognitiva ou perda de interesse da audiência são pontos que tanto o palhaço da ilha de Lesbos quanto empresas como a First Round compreendem e aplicam em suas ações de storytelling. É uma lição empresarial que precisamos ter todos os dias. Caso contrário, nossa história como comunicadores não terá um final feliz.
Jorge Rocha é jornalista, professor universitário, especialista em transmedia storytelling e coordenador do escritório Belo Horizonte do Liquid Media Laab.